Por: Mariana Branco. Fonte: Agência
Brasil
Edição: Jorge Luiz da Silva
Serrinha, BA (da redação Itinerante
do Blog MUSIBOL)
Aprovada na quarta-feira (26) pela Câmara dos
Deputados, a reserva de vagas para candidatos negros em concursos públicos é
motivo de polêmica. Especialistas ouvidos pela Agência Brasil
divergem quanto à pertinência e aos impactos da
nova legislação. O Projeto de Lei (PL) 6.783/13 prevê a destinação de 20% das
vagas em concursos da administração pública federal, autarquias, sociedades de
economia mista e fundações e empresas públicas, por um período de dez anos.
Encaminhada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e pela
Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), a proposta
ainda deverá ser votada pelo Senado.
O advogado Max Kolbe, especialista em concursos e
membro da Comissão de Fiscalização da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito
Federal (OAB-DF), é contrário à aprovação da lei e acredita que a proposta é
prejudicial à boa prestação dos serviços públicos. “Após a Constituição de
1988, houve a transição para o estado gerencial e surgiu a figura do concurso
público. [O concurso foi instituído] para aprovar o candidato mais bem
qualificado a exercer o serviço público. Isso é meritocracia”, argumenta ele,
que também critica o critério para ingresso pelo sistema de cotas.
O projeto de lei determina que poderão concorrer às
vagas reservadas os que se autodeclararem pretos ou pardos no ato de inscrição,
conforme o quesito cor ou raça usado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). O texto também prevê que, na hipótese de declaração falsa,
o candidato será eliminado do concurso ou, se já tiver sido nomeado, terá sua
admissão anulada. Para Kolbe, a regra traz complicações em função do grande
número de brasileiros que podem se declarar pardos. “O Brasil inteiro é
multirracial, toda a população brasileira poderá fazer jus à lei de cotas. Se o
Brasil inteiro vai poder concorrer, vai virar um tiro pela culatra”, prevê.
No entanto, Alexandre Crispi, diretor e professor do Alub, grupo
educacional no Distrito Federal que prepara candidatos para o vestibular e
concursos públicos, não vê prejuízos à meritocracia e prestação dos serviços públicos
e cita o sucesso do sistema de cotas na Universidade Brasília (UnB) e
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), pioneiras ao adotá-lo no início
dos anos 2000 antes que se tornasse obrigatório. “Não é um argumento forte,
pois ele [candidato que entrará pelo sistema de cotas] vai fazer a mesma prova.
Vai concorrer nas mesmas condições. Na UnB, perceberam que a nota [de corte] em
alguns cursos pelo sistema de cotas chegava a ser maior [do que no sistema
universal]. Não caiu a qualidade dos cursos”, defende.
Crispi diz ainda que é preciso acompanhar a
aplicação da lei, se o texto passar pelo Senado e for à sanção presidencial,
para observar seus impactos sobre os concursos públicos. “Acredito que não
haverá grande diferença, até porque a proporção determinada é uma porcentagem
baixa. Mas não tem como, a concorrência vai subir um pouco mais. É como
aconteceu nas universidades. Mas vai ser esperado um prazo de dez anos [período
de vigência da lei] para discutir isso. Vamos verificar como vai ser, se terá
os mesmos bons resultados que nas universidades públicas”, diz. Para ele, o
mecanismo tornou o ensino público superior mais igualitário. “Infelizmente, na
grande maioria estatística [os negros] vieram de colégios da rede pública.
Também estão há menos de 100 anos com acesso à educação”, avalia.
A Seppir e o Ministério do Planejamento argumentam
que há uma discrepância entre o número de negros na população geral, de
aproximadamente 50,7%, e a proporção entre os servidores públicos, de 30%, e
que o objetivo da lei é corrigir a distorção. O frei David Raimundo dos Santos,
presidente da Educafro, organização não governamental (ONG) que acompanhou as
discussões para redação da proposta de lei, destacou que a entidade defendia
uma reserva maior, de 30% das vagas de concursos, que os índios também fossem
contemplados e a reserva de vagas para cargos de confiança. Ele destacou, no
entanto, que a opção será apoiá-la em seu formato atual, já que, se for
alterada no Senado, a matéria terá de voltar à Câmara dos Deputados.
Para o frei David dos Santos, a aprovação na Câmara
foi um “grande avanço”. “O que vai mudar a vida dos negros e integrá-los
plenamente à sociedade é o seu empoderamento financeiro. Estamos na
universidade. Queremos cotas para garantir [a presença da população negra] em
todos os escalões do serviço público, até para ajudá-lo a melhorar. As cotas
vêm consertar o ontem”, declarou.
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