Itacaré, BA (Musibol) - Conquistar estabilidade no emprego,
boa remuneração e garantia do cumprimento dos direitos trabalhistas são alguns
dos objetivos que levam brasileiros a sonhar com uma carreira pública. Alguns
dedicam anos à preparação, que envolve horas solitárias de estudo e
investimentos em cursos. Muitos candidatos, no entanto, reclamam que não basta
dominar o conteúdo das provas e controlar a ansiedade para obter um bom
resultado. Eles também precisam lidar com mudanças nos editais após a abertura
das inscrições, o que, segundo concurseiros e especialistas, pode prejudicar o
planejamento e o desempenho dos candidatos.
De acordo com o diretor da Associação Nacional de Defesa e
Apoio aos Concurseiros, Vincenzo Papariello, embora não haja um levantamento
específico apontando a frequência com que essas alterações ocorrem, elas “não
são raras”. Entre as mais observadas, segundo ele, estão as mudanças em datas
de provas, o seu cancelamento e a inclusão de itens no conteúdo programático dos
exames, assim como a retirada de algum ponto.
“É uma situação que desestabiliza o candidato, que pode
perder o foco e a motivação. A preparação começa cedo e há todo um
planejamento”, disse.
O professor José Wilson Granjeiro, diretor-presidente de um
dos maiores cursos preparatórios para concursos em Brasília, recebe, em média,
60 e-mails por mês de alunos inscritos queixando-se principalmente de
alterações em datas de provas.
“Isso só na minha caixa postal, fora as reclamações que ouço
dos alunos. Infelizmente, essas mudanças ocorrem com certa frequência e
prejudicam quem está em preparação porque desestabiliza todo o plano de estudos
do candidato”, destacou.
O advogado especialista em concursos públicos Alessandro
Dantas explica que a falta de uma lei geral que regulamente o assunto acaba
trazendo incerteza e insegurança aos candidatos. O Projeto de Lei do Senado
74/2010, que propõe regras específicas para a aplicação de concursos públicos,
está em análise na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Casa. Entre
outros assuntos, o texto define que o prazo entre a publicação do edital e a
realização da prova deve ser no mínimo 90 dias e no máximo 120 dias. Dantas
destacou, no entanto, que atualmente há princípios gerais do direito
administrativo que ajudam a nortear as ações.
“Pelos princípios da razoabilidade e da segurança jurídica,
mudanças no conteúdo publicado no edital, por exemplo, só podem ser feitas com
uma antecedência suficiente para que os candidatos se adaptem às novas
exigências. Mas, como não há lei específica, cada juiz pode entender de uma
forma. Vai depender do caso concreto”, explicou.
O advogado enfatizou que são inaceitáveis, em qualquer
entendimento, a exigência nos exames de conteúdo que não esteja relacionado no
edital e a inclusão em provas objetivas de questões com mais de uma resposta
correta. “Nesses casos, pode-se entrar com uma ação pedindo a anulação das
questões e que seja atribuído o ponto ao candidato”, disse.
O advogado alertou, no entanto, que os candidatos devem
ficar atentos a possíveis mudanças em leis previstas no conteúdo dos exames no
período entre a publicação do edital e a aplicação da prova. “Nesse caso, os
candidatos devem ficar atentos porque, se a lei mudar, a avaliação será baseada
no novo texto. Ela mudou, mas já havia a previsão de que fosse cobrada na
prova”, acrescentou.
Quando os candidatos, por causa de alteração em datas dos
exames, não puderem fazer a prova, Alessandro Dantas recomenda que entrem em
contato com a instituição organizadora do concurso para solicitar a devolução
do dinheiro da inscrição. “É possível conseguir [a devolução] por meio de ações
em juizados especiais, mas, em geral, as instituições não se negam a devolver
[o valor da inscrição] quando isso ocorre”, acrescentou.
O consultor legislativo Luciano Oliveira foi eliminado em um
concurso público em São Paulo que teve a data da prova discursiva alterada. Com
a remarcação, o exame coincidiu com outro que Oliveira faria em Brasília. “Eu
já tinha passado na primeira fase em segundo lugar e tinha muitas chances, mas
não tive como fazer porque estava inscrito em outro concurso em Brasília. Havia
me preparado para fazer aquela prova e me senti prejudicado”, disse ele, que só
não ficou mais frustrado porque foi aprovado no concurso do Senado, onde
trabalha atualmente.
Oliveira, que também é professor de curso preparatório para
concursos públicos, diz que ainda mais comuns do que alteração em datas são
modificações, mesmo pequenas, no conteúdo programático. “Quando ocorrem em
período muito próximo à data do exame, podem comprometer o desempenho dos
candidatos. Essas retificações não deveriam ser feitas sem uma antecedência
mínima de 30 dias em relação à prova para dar tempo do candidato se organizar”,
defendeu.
Leonel Tolentino, 25 anos, é formado em enfermagem e estuda,
há um ano e meio, para concurso público na área administrativa. Recentemente,
após ter se inscrito em dois exames para órgãos diferentes, também teve que
escolher qual faria. Um deles teve a data alterada e acabou coincidindo com o
outro. “Não tinha o que fazer, só lamentar. Além de perder o dinheiro de uma
inscrição, perdi também o que paguei no curso preparatório para um deles. É
horrível, a gente fica sem saber o que fazer e perde oportunidade”, disse.
O Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade
de Brasília (Cespe-UnB), uma das principais instituições responsáveis pela
organização de concursos públicos no país, informou, por meio de sua assessoria
de imprensa, que as datas dos exames são sempre prováveis e que busca manter a
regularidade dos cronogramas. Não sendo possível evitar a alteração, por
motivos além da responsabilidade do centro, os candidatos são previamente
comunicados e informados sobre as novas datas das provas.
O Cespe também ressaltou que, de acordo com os editais de
abertura dos concursos que organiza, o valor referente ao pagamento da taxa de
inscrição só será devolvido em casos de cancelamento por conveniência da
administração pública ou de mudança no edital que impossibilite a participação
do candidato que já esteja inscrito, como alteração de requisito para um cargo.
A Escola de Administração Fazendária (Esaf) e a Fundação
Universa, que também organizam diversos concursos públicos no país, não
responderam aos questionamentos da Agência Brasil até o fechamento desta
reportagem.
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