Por: Karine Melo. Fonte: Agência
Brasil
Fotos: jornalcorreiodovale / br.noticias.yahoo.com / cidadaodomundo.org
Serrinha, BA (da redação itinerante
do Blog MUSIBOL)
Deputados da bancada ruralista
prometem apertar o cerco contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a
atribuição do órgão de auxiliar na demarcação de terras indígenas no Brasil.
Entre as estratégias para pressionar o governo por mudanças, integrantes da
Frente Parlamentar da Agricultura dizem já ter assinaturas suficientes - mais
de 180 - para protocolar um pedido de criação de uma comissão parlamentar de
inquérito para investigar a Funai, mas ainda não há definição sobre quando isso
será feito.
Na semana passada o grupo
contabilizou duas vitórias. Na primeira, conseguiu convocar a ministra-chefe da
Casa Civil, Gleisi Hoffmann, para prestar esclarecimentos na Comissão de
Agricultura da Casa sobre as questões indígenas. A data da ida da ministra ao
Congresso deve ser definida ainda esta semana pelo presidente comissão,
deputado Giacobo (PR-PR).
Os ruralistas conseguiram ainda,
na última quarta-feira (10), o apoio que faltava para a criação de uma comissão
especial para apreciar e dar parecer à Proposta de Emenda à Constituição (PEC
215/2000) que inclui, nas competências exclusivas do Congresso Nacional, a
aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, a
titulação de terras quilombolas, a criação de unidades de conservação ambiental
e a ratificação das demarcações de terras indígenas já homologadas,
estabelecendo que os critérios e procedimentos de demarcação serão regulamentados
por lei. A comissão foi criada pelo presidente da Câmara dos Deputados,
Henrique Alves (PMDB-RN), em retribuição ao apoio que recebeu dos ruralistas
para comandar a Casa.
“Nós estamos criando uma série de
injustiças para aqueles que são proprietários de terras, independentemente do
tamanho. O que nos preocupa é a falta de critérios e de uma condição de defesa
dentro dos processos de homologação conduzidos pelos antropólogos [da Funai]”,
diz o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) que integra a Frente Parlamentar da
Agricultura.
O Conselho Indigenista
Missionário (Cimi) reagiu à criação da comissão. Em nota divulgada no site, o
Cimi repudiou a decisão. “O ato do presidente da Câmara constitui-se em um
atentado à memória dos deputados constituintes, ataca de forma vil e covarde os
direitos que os povos indígenas conquistaram a custo de muito sangue e atende
os interesses privados de uma minoria latifundiária historicamente privilegiada
em nosso país”, diz o documento.
Procurada pela Agência Brasil, a
Funai enviou nota classificando a PEC 215/00 como um retrocesso e uma ação
contrária à efetivação dos direitos territoriais dos povos indígenas.
“A Funai acredita que tal medida,
ao invés de contribuir para a redução dos conflitos fundiários decorrentes dos
processos de demarcação de terras indígenas, ocasionará maior tensionamento nas
relações entre particulares e povos indígenas, diante das inseguranças
jurídicas e indefinições territoriais que irá acarretar”, alerta o documento.
Entre as preocupações da Funai
está o fato de a PEC prever a criação de mais uma instância no procedimento
administrativo de regularização fundiária de terras indígenas. “Isso tornará
mais complexo e moroso o processo de reconhecimento dos direitos territoriais
dos povos indígenas - se não significar sua
paralisia -, com graves consequências para a efetivação dos demais
diretos destes povos, como, por exemplo, garantia de políticas de saúde e
educação diferenciadas, promoção da cidadania e da sustentabilidade econômica,
proteção aos recursos naturais, entre outros.”
Esta semana a bancada ruralista
na Câmara deve se reunir com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF),
ministro Joaquim Barbosa. No encontro, os parlamentares vão pedir a conclusão
do julgamento da Terra Indígena Raposa Serra do Sol – que ainda depende da
publicação do acórdão do julgamento e dos embargos declaratórios a respeito das
19 condicionantes impostas pela Corte, em 2009, para que a demarcação da área
fosse mantida em terras contínuas.
Depois que isso for feito, a
polêmica Portaria 303 da Advocacia-Geral da União (AGU) pode entrar em vigor. A
norma proíbe a ampliação de áreas indígenas já demarcadas e a venda ou
arrendamento de qualquer parte desses territórios, se isso significar a
restrição do pleno usufruto e da posse direta da área pelas comunidades
indígenas. Ela também veda o garimpo, a mineração e o aproveitamento hídrico da
terra pelos índios, além de impedir a cobrança, pela comunidade indígena, de
qualquer taxa ou exigência para utilização de estradas, linhas de transmissão e
outros equipamentos de serviço público que estejam dentro das áreas demarcadas.
As divergências da Frente
Parlamentar da Agricultura em relação às atribuições da Funai também levaram o
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a se comprometer a criar um grupo de
trabalho para receber as manifestações dos deputados. Em 30 dias,
representantes da Secretaria de Assuntos Legislativos da pasta, da Funai e
parlamentares devem começar a discutir propostas que envolvem a demarcação e
desapropriação de terras no país.
A Frente Parlamentar
Ambientalista, presidida pelo deputado Sarney Filho (PV-MA), marcou uma reunião
para a próxima quarta-feira (17). Na avaliação dos ambientalistas, os
apoiadores da PEC 215 são motivados por “interesses pessoais e individuais
contrariados”. “A PEC é um retrocesso absoluto, ela acaba com qualquer
possibilidade de política indigenista e de política ambiental. Tirar a
prerrogativa do Poder Executivo de criar unidade de conservação e reservas
indígenas e passar para o Congresso é a mesma coisa de dizer que não vai ter
mais”, disse Sarney Filho.
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